Direito à Participação das crianças – artigo 12. da CDC

Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas veio promover uma nova visão sobre a criança, ao reconhecê-la como um sujeito ativo, dando-lhe importância e atribuindo-lhe direitos próprios. O direito a formar e exprimir opiniões, a ser valorizada a sua participação nas decisões que lhe dizem respeito, a participar e pronunciar-se sobre o seu projeto de vida, a intervir, enquanto parceiro, no sistema de promoção e proteção em que se insere. O direito à participação consiste em garantir à criança, com capacidade de discernimento, o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe dizem respeito, de serem tomadas em consideração as suas opiniões na resolução dos problemas que a afetam, de acordo com a sua idade e maturidade. Por exemplo, ter o direito a ser ouvida nos processos de separação dos seus pais; o direito a ser auscultada em casos de adoção; o direito a ser ouvida sobre o seu projeto de vida. Contudo, a existência de direitos não significa necessariamente que a criança os assimile e os ponha em prática, reconhecendo o seu significado e alcance. Para tal, é necessário ter capacidade para compreendê-los. Falar com as crianças é uma tarefa difícil, que por vezes oscila entre dois extremos. Falar com a criança como se fosse um “pequeno ser” “uma pessoa diminuída de capacidade” ou trata-la como “adulto em miniatura” como “ser responsável e autodeterminado”. O importante é dirigir-se a uma criança como criança que é, como pessoa capaz de entender, sem esquecer que é uma criança, que não vê, nem entende como um adulto, que não consegue pensar e reagir a múltiplos estímulos, mas que tem uma visão sobre o mundo que a rodeia, sobre o que considera certo e errado, sobre o que gosta e não gosta. O verdadeiro desafio é promover uma relação de aproximação, confiança e respeito entre o técnico e a criança, entre o profissional e a criança, como um ser suscetível de pleno direito. Esta relação bidirecional acarreta, por parte do adulto, e das entidades com quem a criança interage, uma maior disponibilidade, capacitação e responsabilização dos profissionais. Não só para a ouvir e para a escutar mas também para ponderar as proposições que veicula, que sugere e induz na interação dialogante fluída e informal com o adulto, antes de tomar uma decisão acerca da sua vida.  Cada vez mais importa escutar a criança, escutar para compreender, escutar para melhor intervir, escutar para a proteger, porque as crianças sabem mais sobre o seu mundo do que qualquer adulto. Tendo em conta este pressuposto, não é demais relembrar e frisar a diferença entre escutar e ouvir. Ouvir remete-nos para os sentidos da audição: a pessoa ouve, mas pode ou não entender a comunicação e a mensagem transmitida. Escutar requer mais que ouvir: a pessoa tem de prestar atenção, entender do que se trata, perceber o que foi dito, compreender e entender o assunto… para depois poder ter e formar a sua opinião, para poder agir ou não em conformidade. Escutar requer treino, autoconhecimento e conhecimento do outro, para poder interpretar os gestos, reconhecer os sinais, perceber as entrelinhas, identificar a “escuta não-verbal” e “a voz silenciosa da criança”.  Mas qual é a idade mínima para as crianças expressarem os seus pontos de vista? A Convenção sobre os Direitos da Criança não estabelece propriamente uma idade mínima para a criança poder ser ouvida. Desde que a criança seja capaz de ter e formar opiniões, ainda que de forma menos esclarecida, deve ser ouvida, logo que patenteie a necessária maturidade (que pode ocorrer antes da idade legalmente estabelecida, definida nos termos da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo aos 12 anos de idade). Sublinha-se, que o direito a ser ouvida não implica necessariamente o direito a que a sua opinião venha a ser aceite, mas apenas que essa opinião seja tomada em consideração. Tal direito engloba igualmente o direito, para a criança, de não emitir qualquer opinião, se esta assim o desejar. Que estratégia para implementar o direito à participação? O Direito à participação tem como pressuposto intrínseco o direito à informação. Sem uma adequada informação sobre as diferentes opções, alternativas e suas consequências, uma criança não está em condições de formar a sua opinião. Ou seja, qualquer decisão, para ser livre, deve ser devidamente esclarecida, informada, ponderada e consentida. O consentimento é uma exigência ética e deontológica a ser observada pelos profissionais na sua intervenção. Decorre do reconhecimento do outro, do sujeito, como pessoa capaz de autodeterminação. Esta obrigatoriedade de respeitar a autonomia do outro é também um requisito legal, um direito individual que a sociedade protege. Para que o consentimento seja sincero e legítimo, a criança precisa de ter uma compreensão clara acerca do mesmo, para ter oportunidade de decidir livremente sobre a sua participação. A obtenção do consentimento requer informação em linguagem clara e adequada à idade da criança, para que esta possa compreender a mensagem e os seus objetivos. Envolve confiança, respeito, diálogo, paciência e persistência na relação técnico-sujeito, sem interferência de outras pessoas. Na intervenção com crianças, esse cuidado, além de respeitar a questão ética e legal, deve ser impulsionador do estabelecimento de uma relação espontânea com a criança, em que as informações fornecidas por esta serão respeitadas, no dever ético-profissional de zelar pela sua proteção integral, considerando o sigilo e a confidencialidade da abordagem profissional. Reforçar a tomada de decisão da criança é fortalecer a sua capacidade de intervenção na defesa dos direitos que lhe digam respeito, na essência do superior interesse da criança.

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